Espaço do galpão do Ateliê397 (Foto: Alexandre Drobac)
Feature

A liberdade nos espaços independentes de arte

Giovana Christ
30 Jan 2020, 4:13 pm

Existe um mundo além das instituições, dos museus e das galerias de arte: os espaços independentes. O termo “independente” é usado para sinalizar que a maior parte deles não depende tanto de patrocinadores para definir sua programação, ao contrário de grandes instituições e museus, cujas verbas provém de fontes públicas e privadas que podem, em alguma escala, impactar suas diretrizes. Conversamos com diretores de quatro desses espaços em São Paulo: o Ateliê397, o Olhão, o Esponja e o Projeto Marieta, para nos contarem como é feita a gestão por lá.

Fachada do Ateliê397 (Foto: Alexandre Drobac)
Espaço de ateliês do Ateliê397 (Foto: Alexandre Drobac)
Espaço do galpão do Ateliê397 (Foto: Alexandre Drobac)
Espaço de residências artísticas do Ateliê397 (Foto: Alexandre Drobac)

Ficou claro que a importância do circuito independente é precisamente essa: ter um espaço no qual exista a liberdade de escolha sobre o que é falado e exposto sem maiores influências externas, sejam elas financeiras, mercadológicas ou tendenciais. O Ateliê397, localizado em um galpão no bairro da Pompeia, existe há dezessete anos e oferece uma abertura para colaboração de novos artistas — muitos deles recém-formados na faculdade —, apresentando-os ao mundo da arte. Tendo começado como um espaço de trabalho compartilhado da crítica de arte Thais Rivitti e do artista Marcelo Amorim, hoje o 397 oferece uma plataforma de visibilidade para artistas que provavelmente não a teriam dentro de uma grande instituição ou galeria, criando uma ponte para inserção desses novos nomes dentro do circuito mais estabelecido.

O sentimento de liberdade criativa e novas proposições povoa os ambientes dos espaços independentes, que acabam se tornando um polo relevante de troca de ideias entre jovens artistas. Isso é aumentado pelo fato de lugares como o Ateliê397, ou ainda o recém-inaugurado Olhão, na Barra Funda, disponibilizarem ateliês para aluguel. O grande galpão do 397 tem capacidade de abrigar até doze artistas de uma vez, enquanto o Olhão — espaço que começou a organizar mostras desde o momento de reforma, há dois anos —, hospeda hoje o ateliê de dois artistas, além da oficina da própria diretora, Cléo Döbberthin.

Fachada do Olhão (Foto: Alexandre Drobac)
Espaço de ateliês no Olhão (Foto: Alexandre Drobac)
Detalhe de ateliê no Olhão (Foto: Alexandre Drobac)
Laje do Olhão, que também recebe exposições (Foto: Alexandre Drobac)

Em contraste com os amplos espaços sediados em bairros residenciais, os núcleos Esponja e Projeto Marieta se alocam em apartamentos no centro da cidade. A horizontalização do debate artístico pode ser observada aqui por meio de cursos e encontros que contemplam assuntos urgentes no cenário da arte contemporânea e em campos como o cinema, a dança e a música. No ano passado, por exemplo, o Marieta ofereceu cursos sobre roteiro, arquitetura alternativa, iluminação audiovisual, entre outros, além do tradicional cineclube às terças-feiras. Em geral, o investimento feito para esses cursos é mais baixo do que em instituições de porte grande, mas não deixa a desejar no quesito convidados: os professores costumeiramente também são apoiadores dos projetos.

O Esponja, por sua vez, investe em programações como reuniões de coletivos, festas com apresentações de performers, batalhas de Vogue, pequenas mostras de cinema, grupos de estudos sobre arte e oficinas. Tudo comunicado de forma intimista e investindo no boca a boca dos frequentadores.

A índole participativa e horizontal presente na programação dos espaços é refletida na decisão coletiva de programações. Carollina Lauriano, uma das diretoras do Ateliê397, é quem cuida da parte das exposições, mas diz que todo calendário é decidido por um conjunto de pessoas que participam das ações do local. “Uma característica do 397 é ter uma gestão muito colaborativa. Tem um núcleo muito forte, mas tem um time de colaboradores que estão ali”, diz Lauriano. Assim como acontece no Projeto Marieta que, segundo Giovanni Pirelli, diretor executivo do espaço, define sua programação por meio de uma junção de várias ideias da equipe de gestão, composta por: Abilio Guerra, Caio Guerra, Helena Guerra, Silvana Romano, Julia Vianna, Julia Zylbersztajn e Pedro Santiago.

(Foto: Cortesia do Projeto Marieta)
(Foto: Cortesia do Projeto Marieta)
Espaço Esponja (Foto: Cortesia)

A maior dificuldade relatada pelos membros desses lugares foi unânime: a gestão financeira. Com a mudança dos editais do ProAC (Programa de Desenvolvimento de Ação Cultural), do Estado de São Paulo, — que antes tinham edições específicas para o incentivo de espaços independentes e que agora se tornaram abrangentes para diversos tipos de manifestações culturais — a manutenção desses espaços está se tornando cada vez mais complicada. Sem esse dinheiro, surgem diversos obstáculos, como a remuneração dos artistas (e, consequentemente, o aumento da participação deles no circuito), a falta de investimento em publicações e ações educativas, e a manutenção de uma gestão no espaço, já que a maioria deles não recebe para gerir o projeto.

Para manter-se de pé e ativos, os espaços independentes apostam em ações diversificadas como venda de trabalhos, promoção de cursos para artistas e interessados, até mesmo festas com alguma contribuição. Por mais que as gestões desses lugares sempre consigam se virar para sobreviver ano após ano, é impossível ignorar que eles estão constantemente ameaçados de encerrarem suas atividades.

Com esses lugares em alerta, o que realmente está em jogo é a nossa possibilidade de crescimento cultural orgânico como cultura brasileira. A relevância desses lugares de encontro para a produção e discussão sobre arte, de maneira informal e intimista, é essencial para a oxigenação do circuito, muitas vezes engessado em formatos tradicionais. É indispensável a abertura que esse tipo de lugar dá para artistas, mesmo os mais consolidados no mercado, para a experimentação fora do cubo branco.


Giovana Christ is a journalism student at ECA – USP, a Brazilian carnival enthusiast and passionate about all types of cultural events. She is part of the editorial team at SP-Arte.

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