Detalhe de "Coeval Magazine x estileras". Victória Carmo veste Calçado de Monstro 'Triplo X' feito por Brendy, 2018. Foto por Pedro Ferreira.
Performance online

Permanente ou provisório? O momento das performances online

Giovana Christ
25 mai 2020, 18h13

Dentro das investigações que estão tomando forma na adaptação à vida quase totalmente virtual, meios artísticos que dependem não só da quantidade de público, mas, principalmente, de sua conexão com ele, a performance tem encontrado um momento de reflexão sobre sua natureza presencial. Não há consenso — como com quase tudo no universo da arte — do que define uma performance, então, ela pode acontecer por qualquer meio, inclusive online. Para Paula Garcia, artista e curadora do Marina Abramovic Institute, “Qualquer ferramenta que a gente tenha: a transmissão ao vivo, o vídeo, tudo isso é como o artista consegue usar essas ferramentas. Tudo é possível, não existe uma coisa certa ou errada”.

Dentro de suas próprias casas, usando os equipamentos disponíveis e a internet, diversos performers estão contornando os obstáculos de não terem público presencial, as complexidades da velocidade da transmissão de conteúdo e o espaço físico restrito que se impõe ao artista confinado. Como nem tudo são flores, Felipe Bittencourt, artista que trabalha com performance desde 2004, pontua que “a gente está com uma plateia que é mil vezes maior e ao mesmo tempo não identificada, eu não sei quem é. É estranho ainda para minha cabeça performar para um público quando na verdade eu estou performando para uma lente”.

Performances pensadas a partir da interação com o público são impossibilitadas, mas a abertura para o uso de novas plataformas de trabalho artístico vem mostrando como essa adversidade pode ser utilizada como insumo para a criação de trabalhos cada vez mais inovadores e experimentais. A obra de Tânia Carvalho desenvolvida para a BOCA Bienal é um exemplo de manifestação transmitida pela plataforma Zoom e que contou com uma entrevista ao final da performance, trazendo os espectadores aos bastidores da apresentação.

Acima: Detalhe de "Coeval Magazine x estileras". Victória Carmo veste Calçado de Monstro 'Triplo X' feito por Brendy, 2018. Foto por Pedro Ferreira.

Como nem tudo são flores, Felipe Bittencourt, artista que trabalha com performance desde 2004, pontua que “a gente está com uma plateia que é mil vezes maior e ao mesmo tempo não identificada, eu não sei quem é. É estranho ainda para minha cabeça performar para um público quando na verdade eu estou performando para uma lente”.

"Cru" (2020), Paula Garcia (Foto: Tandera Filmes / Trem Chic)

"Cru" (2020), Paula Garcia (Foto: Tandera Filmes / Trem Chic)

"Cru" (2020), Paula Garcia (Foto: Tandera Filmes / Trem Chic)

"Cru" (2020), Paula Garcia (Foto: Tandera Filmes / Trem Chic)

No dia 19 de março, a artista Paula Garcia estava preparada para realizar uma performance que vinha preparando há sete anos. Dois dias antes, porém, o estado de São Paulo decretou o isolamento social e a artista se viu tendo que desconvidar os 250 espectadores que iriam assistir a obra “Cru” no galpão em que foi realizada. A solução foi aproveitar que a performance já seria inteira gravada e transmiti-la online para milhares de pessoas. Durante minutos — que mais pareceram horas, pela tensão — cada pessoa presente por trás das telas aguardou angustiado pela colisão de dois veículos que atravessariam o galpão e se chocariam, um deles com a artista dirigindo. Mesmo tendo que dispensar seu público, a artista manteve sua equipe essencial em número reduzido e conseguiu gerar materiais em vídeos e fotos a partir da ação, que geram reflexões sobre a angústia, espera e, agora, sobre o online. 

“Foi muito interessante porque no final a gente teve mais de seiscentas pessoas assistindo ao vivo e tendo um retorno disso, eu tive muito retorno das pessoas depois”, contou a artista.

"Cru" (2020), Paula Garcia (Foto: Tandera Filmes / Trem Chic)
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"Cru" (2020), Paula Garcia (Foto: Tandera Filmes / Trem Chic)

"Cru" (2020), Paula Garcia (Foto: Tandera Filmes / Trem Chic)

"Cru" (2020), Paula Garcia (Foto: Tandera Filmes / Trem Chic)

"Calçado de Monstro SS20". Aun Helden veste Calçado de Monstro 'Calçado de Academia' feito por Nich, 2019. Foto por Pedro Ferreira.

"Calçado de Monstro SS20". Aun Helden veste Calçado de Monstro 'Calçado de Academia' feito por Nich, 2019. Foto por Pedro Ferreira.

Em contraponto de iniciativas que passaram por um processo de adaptação ao online, alguns artistas e coletivos de arte nasceram diretamente nele.

Brendy veste Calçado de Monstro 'Sem Título' feito por Brendy, 2019.
"Websérie Calçado de Monstro EP05". Calçado de Monstro 'Calçado de Academia' feito ao vivo durante videoperformance por Nich, 2019.

Brendy veste Calçado de Monstro 'Sem Título' feito por Brendy, 2019.

"Websérie Calçado de Monstro EP05". Calçado de Monstro 'Calçado de Academia' feito ao vivo durante videoperformance por Nich, 2019.

Em contraponto de iniciativas que passaram por um processo de adaptação ao online, alguns artistas e coletivos de arte nasceram diretamente no online, como é o caso da @calcadodemonstro, trabalho organizado pelxs artistas Boni e Brendy, que constroem sapatos customizados buscando questionar a indústria da moda. No online, xs artistas passaram a compartilhar seu processo de criação a partir de lives e disponibilizando-as, posteriormente, em uma websérie no Youtube. Junto com o @estileras, outro projeto da dupla, os Calçados de monstro e suas roupas já estiveram em desfiles como o da Casa dos Criadores e em performance na SP-Arte de 2018, quando expuseram seu processo de criação durante a Feira.

"Calçado de Monstro SS20". Cotton Roach veste Calçado de Monstro '5e7' feito por Brendy, 2019. Foto por Pedro Ferreira.

"Calçado de Monstro SS20". Cotton Roach veste Calçado de Monstro '5e7' feito por Brendy, 2019. Foto por Pedro Ferreira.

"Websérie Calçado de Monstro EP05". Calçado de Monstro '5e7' feito ao vivo durante videoperformance por Brendy, 2019.
"Websérie Calçado de Monstro EP05". Calçado de Monstro '100% Jesus' feito ao vivo durante videoperformance por Ray Castelo, 2019.

"Websérie Calçado de Monstro EP05". Calçado de Monstro '5e7' feito ao vivo durante videoperformance por Brendy, 2019.

"Websérie Calçado de Monstro EP05". Calçado de Monstro '100% Jesus' feito ao vivo durante videoperformance por Ray Castelo, 2019.

"Coeval Magazine x estileras". Victória Carmo veste Calçado de Monstro 'Triplo X' feito por Brendy, 2018. Foto por Pedro Ferreira.

"Coeval Magazine x estileras". Victória Carmo veste Calçado de Monstro 'Triplo X' feito por Brendy, 2018. Foto por Pedro Ferreira.

Diversas organizações estão disponibilizando editais que viabilizam a produção dessas iniciativas online. Entre eles, o “Edital de emergência Arte como Respiro”, do Itaú Cultural, contemplou duzentas propostas de cenas, performances, intervenções e espetáculos online que serão produzidos durante o período de distanciamento social. Iniciativas como da Fase 10 Ação Contemporânea também buscam estimular a criação de obras artísticas a partir de reflexões sobre o que será do nosso planeta e de nossas vidas após a pandemia. 

Com o aumento significativo de transmissão online das performances, começa o debate que questiona se esse será o futuro dessas manifestações artísticas, ou se, ao final do isolamento social, os artistas e o público voltarão correndo para as galerias, instituições e ruas para continuar construindo suas performances ao vivo com o “calor do público”. Bittencourt acredita que “de repente vai ganhar até outro nome, virar um novo ramo, mas acho que vai sempre continuar na raiz”, que é a performance com plateia presencial.


Giovana Christ é estudante de jornalismo (ECA–USP), entusiasta do carnaval brasileiro e apaixonada por todos os tipos de manifestações culturais. Faz parte da equipe editorial da SP-Arte.

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