Editorial
Mas, afinal, o que é uma performance?
23 nov 2017, 15h23
A arte performática se tornou recentemente o centro do debate no campo das artes visuais brasileiras. No fim de setembro, o performer Wagner Schwartz apresentou a obra “La bête”, em que ele convida o público a manipular seu corpo despido, no Museu de Arte Moderna (MAM), de São Paulo. O fato de uma criança estar presente na plateia gerou grande discussão em torno dos limites da arte e do corpo performático. Em meados de novembro, a pauta voltou à tona com a apresentação do artista russo Fyodor Pavlov-Andreevich, no Sesc Consolação, também em São Paulo. No trabalho, o artista interpreta Lênin em seu mausoléu, onde fica despido, deitado, imóvel e disponível para a interação com o público por cinco horas.
Mas, afinal, o que essas obras carregam em comum para além do óbvio corpo nu? “Performance é uma construção física e mental que o artista executa num determinado tempo e espaço, na frente de uma audiência. É um diálogo de energia, em que plateia e artista constroem juntos a obra”. Foi assim que arte performática foi definida por Marina Abramovic, um do maiores nomes do gênero, em sua palestra do Ted Talks.
Apesar da definição relativamente simples, essa é uma das linguagens mais desafiadoras da contemporaneidade, já que sua apreensão depende de uma conexão subjetiva entre público e artista. Além disso, a arte performática tem o poder de questionar e ressignificar certos conceitos cotidianos, tais como o corpo, a mente e o tempo. Para o público, nem sempre é fácil ter seu lugar comum desafiado.
O corpo performático
Em uma performance, o corpo do artista não serve mais às necessidades básicas ou cotidianas do ser humano, ele é utilizado como instrumento para gerar novos sentidos. No trabalho de Schwartz, o performer se utiliza da nudez para ressignificar sua imagem – ele não mais seria o homem diante da plateia, mas um “bicho” (obra da artista Lygia Clark, manipulável pelo público) à mercê da vontade da audiência em questão. O mesmo acontece com Pavlov-Andreevich. “Durante a performance, o corpo deixa de ser meu e passa a ser uma obra de arte. Em um museu, não se pode tocar em pinturas ou esculturas, a performance é uma das únicas possibilidades artísticas em que a interação com o público não só é permitida como passa a ser parte da própria obra”, afirmou o russo a’O Globo.
Para Paula Garcia, curadora do setor Performance da SP-Arte/2018, esse corpo performático é indissociável de uma intenção política. “Mais do que nunca, acho que a performance tem que trazer um corpo político, tem que trazer um corpo que esteja em diálogo profundo com o contemporâneo, consciente do que está acontecendo”, reflete.
A potência da mente
Mas não é só de corpo que se faz uma performance. O desafio é sobretudo mental. “O performer não precisa ser um atleta, a realização de determinada obra está muita mais ligada a um preparo emocional e mental”, afirma Paula. Na obra “Noise Body”, a artista, após ficar sentada por cinco horas, veste uma armadura de metal e recebe um bombardeio de peças, que, à medida que se aglutinam na vestimenta, a tornam mais pesada. Mesmo claustrofóbica – confessa Paula – ela se sustentou de pé até atingir quase meia tonelada sobre o corpo. Como? “A arte e a performance vêm de um lugar que a gente não sabe. Estão muito mais ligadas ao afeto, ao coração, ao instinto, ao amor, à raiva, à emoção do momento…”, afirma a performer.
A relação com o público é central no desenvolvimento dessa potência mental. Marina Abramovic afirma em sua palestra: “Temos medo do sofrimento, temos medo da dor, temos medo da mortalidade. Então o que eu faço é encenar esses medos na frente de uma plateia. Eu uso a energia do público e, com ela, posso explorar os limites do meu corpo o máximo possível. E aí, eu me liberto desses medos.”
O tempo presente
O tempo também é um elemento muito importante em uma performance. Para Paula, esse tipo de arte não pode ser ensaiada, ela não tem passado, nem futuro. “A performance se dá no tempo. É na presença, no contato entre o performer e o público”, afirma.
O tempo é um dos protagonistas das obras que a curadora vai reunir na SP-Arte/2018, que acontece de 12 a 15 de abril do ano que vem, no Pavilhão da Bienal, em São Paulo. Cinco trabalhos de longa duração vão se estender por todo o período do Festival em um ambiente especialmente construído para isso. “Vai ser um espaço imersivo, onde público e artistas poderão experimentar a potência da arte performática”, afirma.
Confira ainda uma seleção de fotos das performances realizadas na SP-Arte/2017. A lista completa dos trabalhos exibidos na Feira passada está disponível aqui. Em breve, mais informações sobre a 14º edição.
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